A etapa do México foi um paradoxo em todos os sentidos, a previsibilidade que morava na figura dos brasileiros Gabriel Medina, Ítalo Ferreira e Filipe Toledo foi passando para subjetividade logo nos rounds iniciais, a cada rodada os coadjuvantes Ethan Ewing, Deivid Silva, Jack Robinson e Mateus Herdy se mostravam mais fortes.
Ethan Ewing fez a maior somatória da competição, 18.07 pontos, o australiano desconstruiu Matthew McGillivray impondo ao sul-africano uma dura derrota em um momento em que ele precisava de resultado. Ao final da competição Matthew acabou caindo mas isso é um capitulo a parte, nós falaremos mais a frente.
Kolohe voltou surfando melhor do que quando parou, ele despachou o cara que mais evoluiu desde que entrou no tour, mas ainda assim, o cara que tem o surfe mais superestimado, Kanoa Igarashi. Em matéria publicada na última segunda no site da WSL, o colunista Ben Collins disse que Kanoa tinha uma chance clara de título mundial e que ele poderia facilmente vencer no México. Importante, o Ben não é um fã japonês empolgado com a medalha de prata do Kanoa, ele é um “especialista” da WSL. Kolohe, cujo a especialidade é surfar, tratou de colocar ordem nas baboseiras escritas no site da entidade, impondo uma derrota a Kanoa, sem nenhuma margem para parcialidade, passionalidade, tendenciosidade ou subjetividade, Kanoa acabou na 25° posição, algo mais condizente com seu surfe do que o título mundial, com esse resultado, o japonês que sonhava com o WSL Finals, vai ter que esperar até o próximo ano.
O terceiro dia de competições no México começou sutil como uma bomba. Motivo? O cancelamento de Teahupoo! Muita gente que estava na zona de corte e até abaixo dela, que já havia perdido no dia anterior, estavam apostando todas as suas fichas na temida bancada do pacífico. Nomes como Metthew McGillivray, Owen Wright, Michel Bourez, Caio Ibelli e Peterson Crisanto, poderiam garantir suas reclassificações caso houvesse a etapa da Polinésia Francesa, sem precisar do Challenger. Já Alex Ribeiro, Connor O`Leary e Wade Carmichael, mesmo que Teahupoo não fosse cancelado, só poderiam ser salvos do rebaixamento por uma intervenção divina, com o circuito sendo encerrado no México caíram por antecipação: Matthew McGillivray, Owen Wright, Caio Ibelli, Peterson Crisanto, Michel Bourez, Jack Freestone, Wade Carmichael e Connor O´Leary. Caso esses caras queiram surfar novamente na elite terão que ficar entre os 12 primeiros nas etapas do Challenger, que começa logo após o WSL Finals.
A Previsibilidade começou a ser desconstruída no México quando ainda no Round dos 32 Filipe Toledo deu ao indonésio Rio Waida a vitória de presente. Filipe fez a maior nota da bateria logo no início, 8.00 pontos, depois sentou e aguardou uma onda que lhe desse outra nota igual, a onda não veio, além do high score, o brasileiro tinha um 2.23 pontos, Waida que só almejava passar a bateria, fez duas ondas medianas, deixando claro que surfar o suficiente é suficiente para avançar.
Gabriel Medina que geralmente transforma uma onda de 3.00 pontos em uma nota 7.00, fez algumas mágicas em Barra de La Cruz, em especial na virada contra o Bourez, mas a bem da verdade, é importante dizer que ele não foi nem de longe o predador que foi até a perna australiana. No México ele parecia desconectado, com uma leitura péssima de onda e nas ondas, desde o primeiro round ele foi de longe o cara que fez as piores escolhas de onda, perdendo o “time” de algumas manobras as quais geralmente ele é cirúrgico, mas ainda assim conseguiu chegar nas quartas, despachando o cara que fez a maior média do evento, perdendo para o predestinado Deivid Silva.
Já Ítalo, mesmo surfando com uma corrente de ouro que devia pesar uns cinco quilos, estava leve nas ondas, com os habituais “olhos de lince” e confiança inabalável, depois de eliminar Wade Carmichael e Kelly Slater ele encontrou pelo caminho um garoto audacioso, ousado, destemido e sem nenhum tipo de pressão nos ombros, Mateus Herdy. O jovem catarinense já havia vencido Ítalo no Seeding Round, nas quartas Mateus perdia até os minutos finais, quando achou aquilo que provavelmente foi a maior onda do dia, logo na saída ele mandou um aéreo reverse jogando a rabeta nas alturas, pousando tranquilamente depois de um voo sinistro, executando ainda duas batidas, a combinação de tamanho de onda com comprometimento na primeira manobra e variação para finalizar a onda, deu a Mateus a maior nota do evento, a Ítalo restou aplaudir e aguardar o WSL Finals.
O dia final chegou com a certeza que um novo nome entraria na galeria dos campeões de etapas da elite, dos quatro semifinalistas nenhum deles havia feito uma final antes. Deivid Silva chegou com a confiança de quem deixou pelo meio do caminho dois campeões mundiais, Adriano de Souza e Gabriel Medina, Mateus Herdy com a petulância de quem tem pouca idade e muito surfe, Jack Robinson com a segurança de quem vinha fazendo seu melhor surfe no ano e Leonardo Fioravanti com a tranquilidade de quem voltou a surfar no seu melhor nível, as semifinais prometiam.
Na primeira bateria do dia a vitória parecia estabelecida logo na primeira troca de notas, ficou claro que os ataques verticais de DVD se encaixavam melhor nos critérios de julgamento do que a borda de Fioravanti. Tem situações no surfe que não cabe subjetividade, a bateria entre Deivid Silva e Fioravanti foi uma delas, Deivid avançou para esperar seu adversário na primeira final de sua carreira, em uma sexta-feira 13 de boas ondas.
Na segunda semifinal a situação foi tão clara quanto a anterior, Mateus Herdy que vinha de performances acima da média e dono da maior nota do evento, não conseguiu domar as variações executadas com perfeição por Jack Robinson, o australiano apresentou um cardápio com tubos, aéreos e muita borda, já Mateus não conseguiu manter o mesmo ritmo dos dias anteriores, mas devemos admitir, o garoto fez bonito chegando na semifinal como convidado. Esse é o futuro que espera a WSL, o presente, foi a primeira decisão na vida dos dois finalistas, DVD já estava lá, Jack Robinson chegou com vontade.
Antes de falarmos da Inédita final entre os homens, é preciso falar que Malia Manuel surfou quase todo o campeonato com uma camisa homenageando Andy Irons, com a frase “AI Forever”. Andy foi o campeão da etapa em 2006, ela queria captar o espirito do tricampeão e vencer o evento, a havaiana declarou isso logo em sua primeira entrevista, ela surfou como campeã realmente, mas ao chegar na final, já sem a camisa do Andy, encontrou a mais poderosa surfista da qual se tem notícias, a heptacampeã Stephanie Gilmore. A aussie estava em sintonia com a onda, e, quando isso acontece, ela não dá chances a ninguém, foi assim com Carissa na semifinal e com Malia na final. Steph reinou absoluta colocando mais um campeonato na sua galeria de mais de 30 vitorias, impondo a Malia sua sexta derrota em seis finais disputadas.
Adriano se retira com a honraria de fazer uma apresentação especial antes das baterias finais caírem na água, é a primeira vez que a WSL prepara uma despedida homenageando um competidor, certamente merecedora de um campeão mundial, depois de 15 temporadas completas no tour, nós só podemos dizer, OBRIGADO CAPITÃO.
Deivid Silva e Jack Robson entraram na água para fazer a primeira final de suas vidas, no ano em que Adriano, Jeremy, Julian e Mikey Wright, se retiraram voluntariamente, uma final inédita como essa deixa mais que explicito uma troca de guarda no surfe, agora, Jadson, Gabriel, Kolohe e John John são os veteranos do tour. Voltando a final, Deivid e Jack fizeram a bateria mais equilibrada da competição, a prova disso está no placar, 15.16 contra 15.14, embora tenham feito quase a mesma pontuação, o surfe apresentado entre eles foi bem diferente, fieis ao que apresentaram durante toda a competição, Deivid aplicou o melhor da verticalidade, desgarrando e invertendo sempre que atacava os lips, Jack sacou de sua caixinha de surpresas o uso de variados fundamentos, além de usar borda e fundo de prancha em algumas finalizações, o garoto abusou da combinação de progressividade e tubo, aliás, essa foi a combinação de sua onda vencedora. Na maior nota da final ele fez um dos melhores tubos da competição, se não o melhor, despencando no drop, passando por duas seções sujas, por baixo de um lip grosso, esfarelando, saindo direto para um aéreo. Jack variou mais do que DVD, que por sua vez manobrou mais no crítico, os dois fizeram duas abordagens completamente distintas, mas a combinação de fundamentos diferentes foi determinante para a vitória de Jack Robinson, DVD foi gigante, mas hoje foi dia de Jack.
Parabéns Jack Robinson, primeiro australiano a vencer uma etapa no tour desde a vitória de Owen Wright em Teahupoo 2019, Owen que esse ano foi medalhista olímpico mas não se reclassificou pelo CT.
A etapa do México foi importantíssima por vários fatores, pudemos ver a nova geração ganhando protagonismo e musculatura competitiva, com três semifinalistas que nunca haviam chegado naquela fase. Vimos o futuro do surfe brasileiro em ação numa atuação que me fez pensar: Se a WSL está tendo problemas para conseguir patrocínios em virtude do atual domínio brasileiro, como será que ela projeta o futuro ao ver performances como as de Mateus Herdy? Acho bom ela conseguir lidar melhor com isso, porque o domínio brasileiro não está apenas dentro d´água. Embora seja australiano, Jack Robinson venceu surfando com a prancha de um shaper brasileiro, chegou na primeira final de sua vida depois de contratar um técnico brasileiro, ao sair do mar como vencedor nenhum australiano estava ao seu lado, ele foi carregado por seu técnico Leandro Dora e também pelo Yago, sua prancha foi carregada por Peterson Crisanto e sua namorada se chama Júlia e é brasileira, com isso você conclui que onde tem vitória no CT, tem brasileiro no entorno, lide com isso WSL.
A próxima parada é o WSL Finals, Mogan Cibilic e Conner Coffin são os únicos que podem tirar o título mundial do Brasil, você acredita nisso? Dia 09 de setembro abre-se a janela para a decisão mais injusta da história do surfe, no formato dos 45 anos anteriores, hoje Gabriel Medina teria sido coroado tricampeão mundial com antecedência, vamos aguardar e ver se será coroado o melhor surfista do ano, ou o melhor surfista do dia.
Até setembro, Aloha!
Comments